9 de agosto de 2008

Short stories - vol. I - Untitled

Acordou assustada porém não pôde se mover. Suas mãos estavam amarradas por trás das costas, firmemente presas no encosto da cadeira. Olhou para os pés e viu as fitas que os amarravam.

A cabeça latejava. Pontadas fortes que pareciam impedir os pensamentos. Algo estava encrostado em seu olho direito. Passou a língua pelos lábios e sentiu o gosto de sangue.

- “Filho da puta!” – pensou.

Tentou gritar mas apenas conseguiu balbuciar. Com o olho esquerdo aberto viu quando ele se aproximou. Ele não disse nada, apenas apertou o seu pescoço e fez um sinal negativo com a outra mão.

Todo de preto. Máscara. Luvas. Mudo. Ela sabia que conhecia o desgraçado. Mas quem teria motivo para fazer isso com ela?

Apenas uma pessoa poderia odiá-la tanto. Mas será que ele faria isso? Ele jamais faria mal a ninguém, muito menos a ela. Ele era patético!

Casara com ele completamente apaixonada. Mas ela precisava de mais. Precisava de limites. Precisava de controle. E não podia mais segurar sua necessidade de ser desejada. Sabia que tinha os homens aos seus pés. Não estava nesse mundo para ser uma esposa recatada. Ela era viciada no poder de seduzir.

Sim ela amava o marido. Mas também o odiava. Ele era tudo o que ela queria, mas era um idiota. Ele a cobria de mimos e ela o odiava. Ele a perdoava e ela o odiava mais ainda.

Um dia começou a retribuir as investidas do colega de academia. No início era uma brincadeira excitante, apenas isso. O conflito moral dentro dela não permitia nada mais.

Ela reclamava. Se irritava. O ofendia. Mas o idiota nada fazia. Continuava igual. Pateticamente perfeito. Amorosamente resignado.

Não pôde mais se controlar. Aceitou o convite do colega de academia. Ele era feio. Ele era grosseiro. Mas ela gozou como nunca. Voltou para casa se sentindo culpada. E por isso odiou ainda mais o marido.

Passou a encontrar-se sempre com o colega de academia. Certo dia o tal amante francês ligou para ela em sua casa. O marido atendeu. Questionou-a, mas ela inventou uma desculpa esfarrapada que ele achou melhor aceitar. Mas era o que bastava para ela terminar o caso.

Depois foram outros. Muitos outros. Ela voltava tarde e dizia que estava no trabalho. Depois passou a trabalhar no final de semana. A ter viagens de negócios. Todas as desculpas mais esfarrapadas ele aceitava. Não entendia o porque mas seu marido aceitava tudo. Ela agora o odiava com todas as forças.

O soco tirou-a do devaneio. O homem de preto era real e estava descarregando sua raiva nela. Só podia ser seu marido, finalmente reagindo diante de tantas humilhações que ela o fizera passar. Por um instante lembrou-se do homem pelo qual se apaixonara.

- “Eu te amo!”

- “Cala a boca, sua vagabunda!”

Reconheceu o sotaque. O francês!

- “Me ama? Você é uma vagabunda! Quem você pensa que é pra me deixar?”

Mais um soco. Sentiu a dor e soube que seu rosto estava desfigurado. Pensou se ainda conseguiria seduzir alguém sem seu rosto lindo.

De repente uma explosão seca. Com os olhos inchados, mal consegue ver. Mas o francês está estendido no chão. Há sangue. Muito sangue.

Ouve passos. Alguém tenta lhe soltar da cadeira.

- “Calma, meu amor. Eu vou te soltar.”

Seu marido chegara em casa. E lhe salvara da fúria do francês.

- “Você é um idiota. Eu te odeio.”

Um comentário:

Tânia N. disse...

Já lemos "O Último Judeu" e amamos!
Beijocas